Não saber
é seu estado natural
(continuação -
ver parte inicial)
..............Pergunta: Suponho,
então que é a tradição e o condicionamento que criaram o dilema moral para
nós... ?
..............Você está constantemente
monitorando e censurando suas ações e sentimentos: "Agora eu sinto isso, agora
eu sinto aquilo"; "Eu quero ser isso; eu não devia ter feito aquilo".
Você está flutuando pelo passado e pelo futuro todo o tempo, desatento ao
presente.
Não há futuro relacionado com seu
problema (there is no future in
relation to your problem). Qualquer solução em que você
pense é inútil, pois está no futuro. Se houver algo que possa acontecer,
deveria acontecer AGORA.
Mas, uma vez que você não deseja
realmente que nada aconteça agora, você empurra a solução para um
suposto lugar que você chama de "futuro". O que você coloca no presente é o
MEDO. Então
começa a exaustiva busca de um caminho para ver-se livre do medo.
Você realmente quer ESSE tipo de
liberdade? Eu digo que não. Qualquer coisa de que você deseje se livrar,
qualquer que seja o motivo, é a própria coisa que pode livrá-lo.
Você tem que se livrar é da própria
coisa da qual você quer ficar livre. Você está sempre lidando com um par de
opostos; assim, livrar-se de um é ficar livre de seu oposto. Dentro da
estrutura dos opostos não há liberdade. É por isso que digo sempre: "Você
não tem chance... ".
Do memo modo, o homem que não se
interessa por moralidade não se interessará por imoralidade. A resposta ao
egocentrismo está no próprio egocentrismo, não num fictício
estado oposto (não-ego), assim como a liberdade da raiva está na própria
raiva, não na não-raiva, e a liberdade da inveja está na própria inveja,
não na não-inveja.
Toda a atividade chamada religião não é
senão feita de códigos de conduta moral: você deve ser generoso,
compassivo, amoroso, enquanto isso você permanece ambicioso e insensível.
Códigos de conduta são
feitos pela sociedade em seu próprio interesse, sagrado ou profano. Nâo há nada
de religioso nisso. O homem religioso põe o padre e o censor dentro de
você.
Agora o policial foi
institucionalizado e colocado fora de você. Códigos religiosos não são mais
necessários; estão nos códigos civil e criminal. Você não precisa mais se
preocupar com as pessoas religiosas; elas estão obsoletas - mas ela não querem
perder seu poder sobre as pessoas, pois esse é seu negócio, seu meio de vida
está em risco.
Não há diferença entre o policial e
o homem religioso. É um pouco mais difícil para o policial, pois, ao contrário
da autoridade interior plantada pelo homem relligioso, ele está fora de você, e
precisa ser subornado.
Pergunta:
O completo desalento do homem médio para resolver seus dilemas básicos é
reconhecido pelas diversas religiões. Assim, buscadores são direcionados a um
sábio ou salvador. De novo você nega mesma essa fonte de ajuda e
inspiração?
U.G.:
Quando você está sofrendo grandemente e está muito deprimido, o corpo
adormece. É o seu jeito natural de lidar com a situação. Ou você usa a
repetição de palavras como um soporífero - que você chama de "japa' - e entra
num certo tipo de sono. Você inventa um nome como Rama e o repete
infindavelmente, esperando conseguir algum benefício.
Primeiro de tudo, você inventou isso.
Rama não existe, exceto como figura histórica. Havendo criado o monstro, você o
adora e então diz que não pode sair dele. Para mim está tudo bem, se você
continuar com seu "Ram Nam" ...
Pergunta:
A repetição de nomes sagrados é um esforço sincero para encontrar algo
transcendente ao transitório, algo mais permanente...
U.G.:
Não há permanência. A tentativa para obter felicidade permanente e prazer
ininterrupto está apenas asfixiando o corpo, violentando-o. Sua procura por
felicidade se concretiza apenas se destruir a sensibilidade e inteligência do
sistema nervoso.
Querer o que não existe - os bens
espirituais, românticos, religiosos - apenas adiciona energia à falsa
continuidade que destrói o corpo, perturbando radicalmente o equilíbrio químico
do corpo. Este, desejando apenas sobreviver e procriar, trata do mesmo jeito
prazer e dor. É VOCÊ que insiste em parar a dor e prolongar o prazer. A
resposta do corpo a ambos é a mesma: ele geme.
O que quer o corpo? nada a não ser
funcionar; tudo o mais é invenção do pensamento. Ele não tem existência
separada por si mesmo, separada do prazer e dor. As várias vibrações que afetam
o corpo podem diferir em intensidade, mas é você que as divide em boas e más.
Você está constantemente convertendo
vibrações que golpeiam o corpo em experiências. Você toca uma mesa e ela é
"dura", você toca o travesseiro e ele é "mole", você toca o braço de uma mulher
e ela é "sexy", você toca um degrau e ele é "não-sexy". Sem essa
constante tradução da atividade sensorial, você não tem como conhecer se algo é
duro, mole ou sexy.
A inteligência natural do corpo está
processando corretamente o "input" sensorial sem ter que fazer nada extra. É
similar a como o corpo se vira de um lado par o outro durante o sono sem que
haja alguém ciente disso, muito menos tentando controlá-lo. O corpo se
administra por si mesmo.
Você está inteferindo todo o tempo com
o funcionamento natural do sistema nervoso. Quando uma sensação afeta seu
sistema nervoso, a primeira coisa que você faz é nomeá-la e categorizá-la como
prazer ou dor. O próximo passo é o desejo de prosseguir sensações agradáveis e
de interromper sensações de dor. Primeiro, o reconhecimento de uma sensação
como prazer ou dor é doloroso em si mesmo. Segundo, a tentativa de extender a
duração de uma sensação (de prazer), e de parar outra (de dor) é também uma
coisa dolorosa.
Ambas as atividades estão sufocando o
corpo. Na natureza das coisas cada sensação tem sua própria intensidade e
duração. A tentativa de extender o prazer e parar a dor apenas consegue é
destruir a sensibilidade do corpo e sua habilidade de responder a sensações.
Então o que você está fazendo é muito doloroso para o corpo. Se focê não fizer
nada quanto às sensações, você descobrirá que elas se dissolvem em si
mesmas. É isso que eu quis dizer quando falei sobre a "ionização do
pensamento". É isso que que eu quis dizer com nascimento e morte. Não há
"morte" para o corpo, apenas desintegração. O pensamento, sendo material, tudo
o que ele persegue também é material. Eis porque os seus assim chamados
objetivos espirituais não têm significado.
Não me entenda mal: não sou contra o
uso do pensamento para obter o que você precisa; você não tem outra ferramenta
à sua disposição. O corpo está interessado apenas na sobrevivência e
reprodução; esse é o caminho natural. Porque a vida quer reproduzir a si mesma
é outro assunto. O único jeito do organismo humano sobreviver e se reproduzir é
via pensamento.
Assim, o pensamento é muito importante
e mesmo essencial para a vida do organismo. Ele determina se há ou não há ação.
Todos os animais possuem seus pensamentos de sobrevivência, mas no caso do
homem o fator reconhecimento é introduzido, complicando enormemente a
coisa toda. Nós sobrepusemos ao funcionamento sensorial natural um incessante
processo de verbalização. O corpo não está interessado em assuntos psicológicos
ou espirituais. Suas tão prezadas experiências espirituais não tem valor nenhum
para o organismo. Na verdade, elas são dolorosas para o corpo. Amor, compaixão,
entendimento, bênção, todas essas coisas que a psicologia e a religião puseram
ante o homem, estão apenas adicionando tensão ao corpo.
Todas as culturas, quer do Oriente ou
do Ocidente, criaram essa situação distorcida para a humanidade e tornaram o
homem um indivíduo neurótico. Ao invés de ser o que você é - rude - você
persegue o oposto fictício - gentileza. Enfatizar o que nós deveríamos ser
apenas causa tensão, dando energia ao que de fato somos. Na natureza,
encontramos animais violentos e brutais, e outros gentis e generosos. Para eles
não há contradição.
Mas o homem tem escutado que ele deve
ser sempre bom, gentil, amável, e nunca ganancioso ou violento. Enfatizamos
apenas um lado da realidade, distorcendo o quadro todo. Essa tentativa de ter
um dos lados sem ter o outro está criando tremenda tensão, tristeza, dor e
miséria para o homem.
O homem precisa encarar a violência
necessária na vida; você precisa matar para viver, uma forma de vida prospera à
custa de outra. E mesmo assim você condena o matar.
Pergunta:
Se você não se incomoda, eu gostaria de discutir outro tópico com você. Qual é
a conexão entre sono profundo e morte? Em ambos os casos o "eu" está ausente, e
mesmo assim esses estados parecem diferentes.
U.G.:
Porque você está falando de sono profundo? Caso isso exista, não é possível
para a pessoa que está dormindo saber algo sobre ele. Portanto não fale de sono
profundo; é algo que você nunca saberá. O sono real, natural, profundo do corpo
não tem nada a ver com bens poéticos como "morrer para todos os dias
passados".
Nas profundezas do repouso, ou sono
profundo, o corpo inteiro vai através do processo de morte, e pode ou não
retornar ao vigor e normalidade do estado de vigília. Se ele volta e revive,
significa qeu o corpo não perdeu sua habilidade de rejuvenescer-se, e está
livre para prosseguir depois dessa renovação.
Na
verdade , você nasce e morre com cada respiração. Isso é o que se entende por
morte e renascimento. Sua estrutura mental nega a realidade da morte, pois ela
procura pela continuidade a todo custo. Eu não estou informando você sobre o
sono profundo ou qualquer outras teorias, mas apenas puntuando que se você for
fundo o bastante o "você" desaparece, o corpo vai através de uma morte clínica
real, e, em alguns casos, ele pode renovar-se.
Nesse ponto, toda a história do indivíduo, localizada na estrutura genética do
corpo, não mais se separa da vida e retorna seu próprio ritmo. Daí em diante
ela não pode separar-se de mais nada. O que você experimenta em seu sono
superficial é a natureza empurrando para longe seus pensamentos, de modo que o
corpo e cérebro podem repousar.
Se os pensamentos não são efetivamente empurrados para regiões subterrâneas,
não haverá sono.
Mas depois, no sono profundo, a
entidade que estava lá informando a si mesma "Agora estou adormecido" e "Agora
estou acordado" não pode mais ser encontrada; v
ocê não pode mais criar essa divisão na
consciência entre vigília e sono.
Assim, não se incomode teorizando
sobre "estados sem pensamento"; quando o pensamento cessa, você morre. Até
então toda a conversa sobre estados de não-pensamento são os tolos produtos do
pensamento tentando dar continuidade a si mesmo e procurando por um estado de
não-pensamento.
Se você alguma vez fantasiou a si
mesmo de estar nesse estado, isso significa que o pensamento estava lá.
Pergunta:
Os yogues sustentam que é possível extender o estado normal consciência de
vigília até os domínios usualmente guardados pelo sono, isto é, o inconsciente.
U.G.:
Você não precisa praticar quaisquer técnicas de yoga para experimentar essas
coisas; tomando drogas você pode ter essas experiências. Não estou advogando o
uso de drogas mais do que estou advogando yoga. Estou apenas apontando que
todas as experiências nascem do pensamento e são essencialmente idênticas.
Se você chamar os estados induzidos
pelas práticas de yoga ou pelas drogas de "abençoados", ou "mais profundos", ou
em qualquer sentido mais agradáveis do que as experiências "comuns", você está
fortificando o ego e a estrutura separativa da mente, que capta a experiência a
traduz as sensações em elevadas ou baixas, e em agradáveis ou dolorosas. Tudo o
que você experimenta como energia é energia induzida pelo pensamento; não é a
energia da vida.
Pergunta:
O que você está dizendo é o contrário do que as religiões e os santos têm
dito...
U.G.:
Os "gurus" podem dizer o que eles quiserem, assim como os livros; é vantajoso
para eles. Eles estão em um mercado sujo vendendo mercadorias ordinárias.
Pergunta:
Mas eles dizem..
U.G.:
Esqueça-os. O que é você, essencialmente? O que você tem a dizer? Nada. Sentar
e citar outro é fácil, mas não fará nenhum bem aqui. Veja. Neste estado não há
divisão. Nossa situação é que eu não posso transmitir e você não pode
receber esse fato. Além disso, você foi um passo adiante e criou um
problema mais complexo para você mesmo, ao colocar o estado sem divisão
ante você tal como você é (como um objetivo):
isso chama-se busca. Procurar é ser esperto. A procura por paz está
entorpecendo a harmonia natural do corpo. Seu conhecimento e procura
não tem significado porque não há nada dentro da divisão que você criou dentro
de você.
Pergunta:
Porque você discorda de alguns grandes instrutores em várias coisas, será isso
uma razão bastante para tão impiedosamente desprezar a completa herança
espiritual da humanidade?
U.G.:
São coisas sem nenhum valor, tanto quanto você se preocupar com isso. É um menu
sem a refeição. É como um lote de mercadorias à venda. Resultou em hipocrisia e
mercantilistmo. Há algo radicalmente errado com tudo aquilo. Se há algo bom,
não pode produzir maus resultados. Obviamente, as religiões são falsas -
religião, espiritualidade, sociedade, você, sua propriedade, seus motivos e
valores, a coisa toda.
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